.doutor. (ou conversa de consultório)

terça-feira, 25 de janeiro de 2011




doutor, ter dor é condição de estar doente?
eu devo ser meio demente.

porque não dói.
não incomoda.
não modificou nada por fora.

mas é que esvaziou.
desbotou por dentro.
e tudo veio à tona como outrora.

mas não coça.
não parei de comer.
não tenho pintinhas vermelhinhas.

mas ele foi embora.
isso, doutor, eu tinha de lhe dizer.

ele foi embora e eu não sei mais o que fazer.

doença de se morrer acho que não é.
mas há de ser coisa "braba".
porque semana passada fui ter com padre inácio.

um pai-nosso e sete ave-marias.
todo meio-dia.

e depois que deixei a sacristia.
ainda fiz promessa para santa luzia.

ando mal, doutor, ando mal.
a reza não deu jeito.
a promessa não fez com que ele voltasse.

- receite um remédio. é. receite qualquer remédio aí que eu tomo. agora baratinho. porque como também deixei de trabalhar, entrou outra no meu lugar.

e tem mais. se o remédio não servir. vou ver se arranjo um cacho de flor bem bonito. iemanjá há de resolver.

e quando ele voltar.

vou poder dizer tudinho. sem nem respirar.

que ele é quem não presta. que ele é quem não vale nada. que ele é que não me deu valor.

- mal educado, só ele foi quem falou.

Ana Maria de Queiroz
24.I.2011

.insinuação.

quinta-feira, 27 de maio de 2010




não há espaço para nós dois.
ou desistes ou desistes.

não vou ceder.
não está no meu escript essa cena medíocre.

não desarme minhas armadilhas.
não desfaça meus melodramas.
são para te fazer ir.
e me deixar aqui sentada.
embasbacada.
com o que não conquistei.
ou com a oportunidade desgastada.

vá, vá embora.
deixe-me sozinha.
como outrora.

se lhe serve de consolo.
tenho um ombro.
não seja assim tão tolo.

vá, vá embora.
beije a boca de quem te ama.
verdadeiramente.
de quem por ti clama.
chama.
inflama.
e todas essas rimas bobas.

enquanto eu vou permanecendo.
para tua tristeza ou satisfação.
eu que nunca terás na mão.

Ana Maria de Queiroz
27.V.2010

.elvira.

terça-feira, 9 de março de 2010



elvira nasceu num belo dia de sol, de uma quarta-feira qualquer.
isso fora há mais ou menos três décadas.
nunca se sabia calcular muito bem as primaveras dessa mulher.

cheirava qual rosa despedaçada por criança desavisada.
num jardim recatada.
suplicando para não ser perturbada.

elvira tinha essa peculiaridade.
chegar de mansinho.
sair sem ser notada.
e assim vivia essa vida aguada.

quando carlos chegou tudo se encontrava no lugar.
com menos de seis meses nem bem pensamento elvira conseguia organizar.
apaixonara-se.
perdidamente.

carlos era homem mundado.
com idade de saber mais.
com maldades.
era mesmo sagaz.

fez as vezes.
trouxe sorrisos.
acrescentou aos suspiros que elvira não parava de dar.

casal de poucas palavras.
eles não queriam dizer quase nada.
bastava olhar.
e tocar.
e amar.
elvira só não sabia que esse último verbo estava no singular.

zorieuq de.
09.III.2010

.inacabado.

segunda-feira, 8 de março de 2010



e desde que você se foi esse nó apareceu.
e por mais convarde que eu seja, tenho tentado desatar.
e por mais inerte que possa ser, tenho procurado ir embora.

que é pra não perceber o vazio de ter ficado.
que é pra não ouvir mil vezes aquela canção.
que é pra não ter de me sentir obrigada a relembrar.

antes eu tinha a quem culpar.

e tantas coisas viraram marasmo.
todo dia é quase domingo.
toda melodia deixa deprimido.



[inacabado]

- como quase tudo na vida. e como o que ficou de tudo o que foi.


09.III.2010

.também.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009



engraçado é que pensar me faz esquecer.
ao contrário do que deveria ser.
pois é.
só pra ter uma idéia, até quando sonho acho motivo pra amnésia.
estranho jeito de te guardar.
como se o tempo só fizesse desgastar.
mas ele também congela.
ele também mantém.
se o que penso é também o que abstraio.
se o que eu lembro é também o que ensaio.
na tentativa de simplesmente permanecer.

.ana.de.queiroz.
12.XI.2009

.resultado.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009



eu vou fazer você parecer nada.
- paga pra ver.
vou deixar tua memória arrasada.
que é pra você aprender.
que comigo isso não se faz.
comigo, o negócio é perspicaz.
saiba jogar, rapaz.
saiba fazer.
pra depois poder dizer que perdeu só porque tinha de ser.


.zorieuq De.
04.XI.2009

domingo, 27 de setembro de 2009





Toda vez que eu penso naquele dia me dá uma agonia.
Porque mal lembro quando foi.
Só sei do abraço que não senti vontade de apertar.
Das mãos perdidas explicando não-sei-o-que-lá.
Mas, mesmo assim, surge esse desejo que dá.
De imaginar o que não aconteceu.
Infinito perdido nos pensamentos meus.

Zorieuq De.
26.IX.2009